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Introdução

O número 17 (dezembro de 1994) da Revista de Matemática Universitária trouxe uma tradução do artigo On Proof and Progress in Mathematics (Sobre prova e progresso em matemática) do matemático William Thurston, na qual se lê o seguinte (pp. 12-13):

A matemática como a fazemos é formalmente muito mais completa e precisa que qualquer outra ciência, mas é muito menos completa e precisa na sua essência do que programas de computador. A diferença não é apenas o volume de esforço: o tipo de esforço é qualitativamente diferente. Em programas de computador extensos, uma enorme parte do esforço deve ser dedicada a um sem número de questões de compatibilidade: assegurando que todas as definições sejam consistentes, desenvolvendo 'boas' estruturas de dados que tenham generalidade útil mas não atrapalhem, decidindo a generalidade 'correta' para as funções, etc.

Acontece que as "questões de compatibilidade" mencionadas por Thurston não são — ao contrário do que suas palavras podem sugerir — uma exclusividade de programas "extensos". Questões de compatibilidade devem estar presentes em todas as demonstrações matemáticas "formalmente" corretas. A diferença não é "qualitativa", mas pragmática: esperamos que um programa de computador funcione a todo custo, e podemos, efetivamente, rodá-lo para ver se cumpre as especificações; ao passo que, classicamente, uma demonstração é escrita para ser "rodada" tranqüilamente em nossos cérebros, sem a pressão das urgências.

Um dos objetivos deste artigo é mostrar, por meio de um exame de caso, que as "questões de compatibilidade" são decisivas até mesmo em demonstrações de fatos elementares. Vejam o caso desta propriedade do número 9:

Teorema. A diferença entre dois números que só diferem entre si pela ordem dos seus algarismos é sempre um múltiplo de 9.

Uma demonstração desse teorema (visando justificar uma aplicação recreativa do mesmo) apareceu num pequeno artigo intitulado O nove misterioso, da autoria de Doherty Andrade, publicado no número 9 — coincidência? — da Revista do Professor de Matemática (RPM). O argumento não é dos mais simples, mas despertou a minha atenção justamente porque contém erros na estrutura dos dados. O exame desses erros tem muito a ensinar a todos aqueles que se preocupam em fazer matemática com correção e rigor. Este é o nosso objetivo maior.

Nas próximas páginas, reproduziremos partes do artigo de Doherty Andrade, ilustraremos a idéia básica do argumento, discutiremos os erros encontrados e terminaremos com algumas sugestões e exercícios.

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Carlos César de Araújo, 25 de agosto de 2003